sábado, 27 de agosto de 2011

Murilo Ferreira: A dinâmica do partido comunista

O partido comunista é uma organização de combate ao capitalismo. É comunista pelo que tem de conteúdo concreto, ou seja, seu elemento estruturante, o proletariado, mas o proletariado consciente de sua situação de classe - “classe para si” – É comunista pelo que tem também de conteúdo abstrato, isto é, seu conjunto de idéias - ideologia, política, cultura e prática - mais precisamente seu pensamento tático e estratégico ou sua práxis.

Uma práxis revolucionária, transformadora, que caminha para um ponto chave de ruptura com o sistema do capital e que se direciona, com firmeza estratégica, para a construção de um mundo novo, o mundo do socialismo.

Essa organização pretende crescer e conquistar o poder, pois pouco ou nada de seu pensamento poderá se materializar se ele se encontrar em outras mãos. E conquistá-lo é uma condição primeira para qualquer organização partidária realizar o seu conteúdo ideológico. Esse processo não é nada fácil, é uma luta em si, pois leva não somente a uma substituição de um partido pelo outro, mas a derrota de uma classe, a burguesia – que há 400 anos exerce o seu domínio - e a vitória de outra, o proletariado - que pouca experiência teve com o exercício do poder - portanto, é uma luta de classes.

Crescer e conquistar o poder constitui um só processo, podendo ele ser ou não revolucionário. Uma organização pequena dificilmente poderá mobilizar energias e dar iniciativa e impulso às transformações; mas também por si só uma grande organização, mesmo que venha a conquistar o poder, também não é garantia de que se terá iniciado uma nova fase revolucionária. Então o decisivo é o processo de crescimento - é não se perder no meio do caminho - pois uma vez que no processo de crescimento vai-se perdendo substância revolucionária, isto é, “esvaziando-se” a ideologia, acaba ocorrendo uma transfiguração para outro tipo de organização, certamente não proletária e de conteúdo ideológico estranho ao socialismo.

A luta de classes pela conquista do poder é uma luta extremamente desigual e difícil. A classe dominante dispõe de instrumentos de repressão - a violência pura e simples - mas também de instrumentos ideológicos, que fazem com que as vítimas do próprio sistema acabem consentindo com sua própria condição. Então, como diz Gramsci, existem duas formas de domínio - a força e o consenso. Para a efetiva realização da produção capitalista é necessário que haja também um ambiente minimamente pacífico, isto é, que o processo de luta de classes não se degenere a tal ponto que se crie óbices à livre circulação e acumulação de capital. Então, a segunda forma, o exercício do poder através do consenso é a forma preferida da dominação do capital, sabendo-se que a burguesia, em última instância, jamais abrirá mão de lançar a mais perversa onda de violência contra quem quer que a ameace.

Dos regimes patrocinados pela burguesia - dentre eles o regime do terror e o regime democrático – o que nos interessa é o segundo. Não que o regime democrático vá além dos limites da dominação burguesa, mas porque simplesmente este regime nos permite mais liberdade de organização e condições melhores para fazer o debate político e teórico com a sociedade, forjando consciência revolucionária e substância para a transformação social. Não é a toa que a formulação marxista de que à medida que o capitalismo se desenvolve ele cria os seus próprios elementos de superação é absolutamente atual, pois se esse ambiente de relativa tranquilidade caracterizada por um amplo consenso ideológico de conteúdo liberal e mercadológico contribui para o desenvolvimento do capital, também contribui para o desenvolvimento do partido comunista, à medida que sob esse regime democrático, ao contrário do regime do terror, ele consiga realizar não somente a luta política partidária, mas também a luta de idéias.

Portanto, o regime democrático proporciona que o partido comunista possa realizar ações e intervenções em várias esferas da sociedade. Dizer que o partido comunista tem que se firmar entre os trabalhadores está dado desde 1848 quando Marx e Engels escreveram o Manifesto do Partido Comunista. Aliás, o partido é o próprio proletariado - em nada pode se distinguir dele - mas um proletariado diferenciado, isto é, enquanto “classe em si”. No próprio conceito de proletariado já está embutido essa caracterização, senão não seria proletariado, seria apenas uma massa atônita, desraigada e estéril na luta pelo socialismo, elemento até para engrossar as fileiras da classe dominante. Portanto, o proletariado é uma classe organizada, que é mesmo que o partido comunista. O partido comunista, por sua vez, não poderá ser outra coisa senão o próprio proletariado organizado, ambos absolutamente convictos do seu papel na história.

Mas nesse desafio de crescer está posto a necessidade de enfrentar a luta em diversas esferas da sociedade. E mais do que isso, de se inteirar do que é mais atual em política e em economia, isto é, da atualidade da luta de classes e do curso real dos acontecimentos, como se move o capitalismo, o mundo, as nações, as diversas sociedades e suas classes e frações de classe, enfim, do movimento dialético da história. Um partido comunista deve saber fazer esse estudo, adquirindo consciência e sabedoria do momento presente e do que pode vir a ser o futuro imediato, vindo assim a formular a sua tática, que vem a ser o seu posicionamento político frente ao enquadramento mais geral - diversas forças políticas e a sociedade.

Hoje, ainda sob o efeito avassalador da derrota das experiências socialistas do século XX, a forma atualizada de dominação do capital é o neoliberalismo – livre circulação de capital, hegemonia do capital financeiro, desregulamentação, privatização e desnacionalização, enfim, um regime que tem como objetivo central destruir a soberania das nações e controlá-las ou dirigi-las a partir de um único centro de comando mundial, o centro do capital financeiro: EUA. Assim, a tática mais geral dos comunistas na atualidade é derrotar o sistema neoliberal e fazer vitorioso o Projeto Nacional de Desenvolvimento, haja vista que a luta pelo socialismo não está posta de maneira imediata.

Ainda citando Gramsci, que dizia ser preciso que o proletariado se lance a um processo de conquista da hegemonia política e cultural mesmo antes da conquista do poder. Assim esse trabalho de construção hegemônica aqui para nós tem se dado pela luta de posição, em contraposição à tática de “tomar” poder por uma grande movimentação. E nisso está o elemento chave que é o da disputa de consciência nas várias esferas sociais e até mesmo a disputa da consciência de um operário que seja. Cada posição ganha, cada “trincheira” conquistada, se somará ao final, num processo relativamente longo de acumulação de forças. Assim, a luta ideológica coloca-se no mesmo patamar de importância ao posicionamento tático partidário e da luta política imediata.

Não se trata de colocar a ideologia à frente da política, pois sabemos o quanto a luta política imediata é fundamental para inserir a organização partidária no curso real da história. Mas se trata de equilíbrio e interação dialética entre ambas as frentes, sem descuidar de nenhuma. O maior alerta é que nesse processo de conquista de hegemonia estamos obrigados a fazer concessões a outras classes aliadas na luta contra a hegemonia da burguesia financeira. Essas concessões e alianças são necessárias, pois esse tem sido o caminho para fazer o partido crescer e aumentar sua influência, como tem ocorrido. Acrescente-se a isso o processo de abertura partidária a quadros e elementos diferenciados da sociedade, com concepções e ideais também diferenciados. Portanto, é nesse quadro que temos que cuidar melhor do papel da consciência e da cultura como arma contra o pragmatismo.

Por outro lado, o reforço ideológico também não pode vir desacompanhado da compreensão tática e da sua função de inserção partidária no movimento real. O desafio é estabelecer uma estreita relação entre a luta política imediata e a consciência ideológica do socialismo, isto é, relação dialética entre tática e estratégia, sendo a tática a serviço da estratégia ou a luta política imediata a serviço do socialismo. Mas ainda assim a concepção ideológica do militante é o maior patrimônio partidário. Já as conquistas políticas imediatas, embora importantes para a luta cotidiana, podem se tornar efêmeras frente a um contexto adverso. A soma das posições partidárias mais a elevação geral do nível da consciência de seus militantes é o caminho mais próximo para o socialismo.

Murilo Ferreira é engenheiro agrônomo e mestre em Administração Rural e Desenvolvimento. É diretor do Sinpro e da CTB Minas.

Publicado no Portal www.vermelho.org.br seçao Minas Gerais em 25/08/11

http://www.vermelho.org.br/mg/noticia.php?id_noticia=162441&id_secao=76

segunda-feira, 8 de agosto de 2011

Murilo Ferreira: Dilma, a JK de Saia

O historiador e assessor sindical Sérgio Danilo Rocha conseguiu enfim me convencer de que a inflação é mesmo desagregadora de base social. Assim, o que teria mesmo derrotado o governo JK senão a inflação galopante? Ninguém duvida de seu audacioso e extraordinário Plano de Metas - superado na época somente pelos Planos Quinquenais da antiga URSS – que tinha como tripé de sustentação o capital Estatal, o capital nacional e o capital estrangeiro.

Apesar das críticas de endividamento excessivo externo o Plano de Metas relançou o Brasil - integração nacional, industrialização, infra estrutura e modernidade.

Ante essas conquistas e ante o cumprimento das metas o endividamento externo não obstruiu, mas ajudou a alavancar o país, pois ele não era o centro, mas estava sim associado, portanto, justificável no contexto do Brasil de década de 1950. E mais, o governo JK nos deu altivez, perspectiva e prosperidade, ao mesmo tempo em que rompeu com os controles e constrangimento impostos pelo FMI/imperialismo. Mas foi politicamente derrotado... E o que dizer do papel da inflação na derrota do governo centrista da Nova República e na pavimentação da vitória dos neoliberais em 1989? Sim, Sérgio Rocha tem razão, a inflação promoveu grandes estragos nacionais!

No governo Dilma, desde inicio, tem-se uma preocupação constante com o controle inflacionário, pois é o que vem garantindo a unidade de amplas forças políticas e a continuidade do projeto político de uma presidenta em início de mandato, caso contrário, não haveria dúvidas de que a direita faria bom uso político da escalada dos preços. Aliás, essa pode ser uma questão nevrálgica para a nova UDN, salvando-a do colapso e da fragmentação e alcançando organicidade, unidade e plataforma de combate a nosso governo.

Para nos nortear melhor, as contas do governo Dilma estão melhores do que o do governo Lula: a dívida líquida do setor público em junho de 2011 estava em 39,7% do PIB; a economia para cumprir a meta de superávit primário chega ao primeiro semestre a quase 80 bilhões de Reais, restando apenas cerca de 40 bilhões no segundo semestre para cumprir a meta anual de 117,9 bilhões - e com isso ter mais folga para realizar investimentos e obras sociais - além de a economia continuar a crescer sustentavelmente, em torne de 5% em termos anuais, o desemprego estar em baixa e o consumo e a renda da população continuar crescendo. Essa situação levou o FMI a afirmar que o país estaria com sintoma de superaquecimento, o que não acredito, mas que reflete o quanto o país em nada se parece com o país dos neoliberais.

Agora o governo lançou um programa que seria um resgate da boa tradição desenvolvimentista, isto é, a Política Industrial. Apesar daqueles que acham que são apenas medidas paliativas, acho sim que ele abre uma nova etapa do Projeto Nacional, que consolidará o papel da indústria nacional num ambiente de crise internacional e de fortes ameaças, e que vem, basicamente, de duas direções: uma dos EUA, com suas medidas protecionistas e de desvalorização do dólar, e que está afetando em muito a competitividade desse nosso setor, a outra, é o papel agigantado da Indústria chinesa, cujo PIB industrial já superou o dos EUA, e que inunda o Brasil e a America Latina de bens de alto valor agregado, enquanto nós a abastecemos de commodities agrícolas e minerais, numa relação clara de concorrência desleal.

O governo Dilma ataca esses dois problemas, que já são muito, pois também temos que ter a cautela necessária para não nos tornamos uma ilha. Foi o protecionismo que mergulhou o mundo numa grande depressão na década de 1930. A via brasileira tem sido aquela inaugurada pelo presidente Lula, a da integração com os emergentes e, principalmente, a integração latino americana. Fiquemos atentos, pois o protecionismo elevado a certos patamares não nos interessa. A balança comercial nos tem sido muito favorável e podemos chegar a cerca de 30 bilhões de dólares em superávit comercial em 2011, bem acima da previsão do mercado e do próprio governo. Nos últimos 12 meses exportamos 235 bilhões de dólares, algo impensável há anos atrás.

Por último, é verdade que a taxa básica em 12,25% nos coloca com os mais elevados patamares de juros do mundo. Esse seria um nó cego que temos para desatar. Mas ninguém também nega que o governo, ao lançar mão da política de juros, tem tido alguma eficácia no controle da inflação. Para mim é uma situação semelhante ao papel do endividamento externo no governo JK, isto é, se o programa de governo está sendo cumprido, se a situação geral da economia e do povo vai melhorando, então, os juros elevados constituem o preço que temos que pagar para o atingirmos os nossos objetivos.

Para os EUA, por exemplo, existe uma situação pouco confortável com relação a essa política, isto é, estão de mãos atadas com relação a este instrumento, já que não podem elevar a taxa porque senão freia o crescimento, e tampouco podem abaixá-la, pois já está praticamente perto de zero. Ninguém também nega o pioneirismo de Dilma em usar outros instrumentos, como as medidas macroprudenciais de contenção do credito e do consumo, uma inovação desde a implantação do Plano Real e que teria a vantagem de ser uma alternativa á elevação da Selic. O resultado também é promissor, pois já existe uma expectativa de queda inflacionária para o próximo período e, consequentemente, dos juros.

Tudo isso aponta para um diagnostico amplamente favorável destes primeiros sete meses do governo Dilma, realmente ela tem sido muito competente, audaciosa, inovadora e apontando para um avanço do legado do presidente Lula. Sim, o Brasil vai seguir em frente, com planejamento, crescimento sustentado, distribuição de renda, inflação controlada e a derrota da direita, acima de tudo.

Murilo Ferreira é engenheiro agrônomo e mestre em Economia Rural pela Universidade Federal de Lavras. É diretor do Sinpro e da CTB MInas

Publicado em 08-08-11 no Portal www.vermelho.org.br/mg

ou http://www.vermelho.org.br/mg/noticia.php?id_noticia=160754&id_secao=76

segunda-feira, 4 de julho de 2011

Murilo Ferreira: Segurança alimentar e o projeto nacional

Sabe-se que os países “emergentes”, entre eles Brasil, Índia, Rússia, China e África do Sul, os chamados BRICS, vêm apresentando taxas médias de crescimento econômico acima da média mundial por um bom período, desde pelo menos o início deste século, o que vem invertendo uma tendência inexorável do sistema capitalista, desvirtuando o eixo de desenvolvimento mundial do centro para a periferia.

Completando esse quadro os países capitalistas centrais e as nações com alto grau de dependência a eles, como Estados periféricos da Europa, desde 2007 estão enfrentando uma forte crise econômica, tendo como centro as finanças, especialmente as finanças públicas, mas que afeta a produção, o emprego e a renda. Em termos mais gerais passam ainda por grandes dificuldades os EUA, a Zona do EURO e o Japão. Como diz Delfin Neto: “A crise de 2007/09, que atingiu o sistema financeiro e interrompeu o “circuito econômico”, já custou mais de 5% do PIB mundial e deixou desempregados mais de 30 milhões de homens honestos trabalhadores” (Valor, 28/06/11).

Ao se debater e ver o chão tremer ante abalos catastróficos no reino das finanças, o chamado mundo rico assiste inerte a um brutal deslocamento do dinamismo econômico planetário para regiões além do seu “quintal”, onde se vê erguer uma robusta e vigorosa plataforma industrial sobre uma base imensa de força de trabalhado a baixo custo - vide China e Índia. Esse processo já havia começado nas duas décadas finais do século passado, onde contribuiu para inundar o mundo de mercadorias e especialmente satisfazendo o elevado grau de consumismo estadunidense. Contudo, fruto do processo de desenvolvimento desigual entre as nações, enquanto os países ricos mergulharam numa profunda crise os emergentes se relançaram em condições mais favoráveis para interferir a seu favor no jogo da política e economia internacional, como prova o peso que o G20 – as 20 nações mais desenvolvidas - passou a desempenhar.

É uma janela de oportunidades para diversas nações encontrarem um via de desenvolvimento autônomo, independente e soberano e que superem os diversos entraves e óbices a cada projeto de desenvolvimento nacional, bem como se livrarem das imposições e condicionamentos feitos pelo antigo G7 - o grupo das sete maiores economias – com a finalidade de se evitar o aparecimento de novas potências ou concorrentes e que procuram criar toda sorte de mecanismos para limitar ou coibir a expansão e prosperidade dos países periféricos, como já ocorreu em diferentes épocas históricas.

Tudo isso vem mudando a vida dos países, e das pessoas também. Além dos BRICS, muitas outras nações apresentaram um ritmo elevado de crescimento, tanto na Ásia, na América Latina e Central, como também na África. Todos juntos, somados às super populosas China e Índia, dão a idéia de fenômenos contundentes e desafiadores, colocando em outro patamar a luta dos povos e nações contra as políticas do imperialismo, mais precisamente a doutrina neoliberal, possibilitando o surgimento de alternativas democráticas e populares e que podem pavimentar um novo caminho - ou caminhos - em direção ao socialismo.

O crescimento fora de lugar do capitalismo tem gerado conseqüências na participação relativa do PIB mundial nos últimos anos entre os emergentes e os países ricos, com nítida elevação da participação dos primeiros em detrimento dos segundos. Além do crescimento econômico, com todas as suas implicações na queda das taxas de desemprego entre os periféricos e crescimento da massa salarial, acrescentam-se as políticas de distribuição de renda que ocorrem, entre outros, como no Brasil, que “desde 2003 um total de 50 milhões de pessoas – mais que uma Espanha – se juntaram ao mercado consumidor” (Marcelo Neri, Valor:28/06/11). O resultado tem sido um grande impulso global do consumo entre os mais pobres, diferente do padrão da década de 1990, onde apenas os ricos, precisamente os consumidores estadunidenses, se esbaldavam num consumismo irracional e desenfreado.

O padrão diferenciado do consumo mundial tem gerado também uma elevação mais do que óbvia da demanda por gêneros alimentícios, por isso a tendência às pressões inflacionárias entre as commodities agrícolas. Não somente isso, mas a crise financeira dos países centrais - com medidas como as tomadas pelos EUA de grande expansão da base monetária para estimular sua economia a sair da crise – tem criado uma bolha especulativa em torno daquelas mesmas commodities, o que também contribui para a forte valorização delas no mercado mundial. Para agravar mais ainda o quadro, 40% da produção estadunidense de milho é destinada à produção de Etanol; e no Brasil, segundo maior produtor de soja, 10% desta é destinada à produção de biodiesel (Luiz Lourenço, Valor: 28/0611).

Essas pressões têm impactado os seis primeiros meses do governo Dilma, que acabou por adotar fortes medidas de contenção do consumo, como limitações ao crédito e, principalmente, elevação da taxa básica de juro, que no último período do governo Lula estava em 8,75% e agora se encontra em 12,25%, uma das maiores do mundo. Outro problema para o Brasil tem sido a valorização da taxa de câmbio, o que prejudica a indústria nacional frente à maior competitividade da indústria estrangeira, dentre elas a chinesa, que nos tem trago motivo de muita preocupação, pois efetiva-se cada vez mais uma relação de troca desigual entre os dois países, onde, basicamente, exportarmos commodities agrícolas e minerais e importamos bens industrializados e de alto valor agregado. Muitos analistas defendem que o Brasil está se desindustrializando.

É fácil observar porque a valorização excessiva do real acontece. Primeiro o convite à especulação de capitais estrangeiros para ganhos de arbitragem devido à elevada taxa de juros; segundo, melhorou muito os termos de troca do comércio exterior brasileiro, como se observa no comportamento dos preços das quatro commodities que representam um terço das nossas exportações: nos últimos 12 meses a soja subiu 32%; o petróleo 44%; o minério de ferro 46% e o café 77% (Valor: 28/06/11). E terceiro motivo, a forte entrada de Investimento Direto Estrangeiro (IED) em diversos ramos da produção no país por conta da estabilidade econômica e do crescimento sustentado dos últimos anos, mais precisamente na exploração do pré-sal e nas obras da Copa 2014 e Olimpíadas 2016.

Esses fatos demonstram o quanto as medidas liberalizadoras do câmbio e dos movimentos de capitais colocam em risco a estratégia de desenvolvimento nacional. Foram justamente a desregulamentação e a expansão desproporcional do sistema financeiro mundial as razões para uma das maiores crises do capitalismo, desde 1929. Não dá para se pensar em equilíbrios via mercado quando nossa indústria corre risco de afundar. O fato de estarmos com um saldo comercial confortável à base de exportação de commodities não justifica a leniência com relação à recuperação e à reestruturação do nosso parque industrial para um novo tempo que está surgindo, sob pena de se sacrificar o futuro da nação. Também não se pode culpar a agricultura pelo descaso das autoridades com o setor industrial. A agricultura brasileira segue seu caminho de expansão sem contar com qualquer coisa semelhante aos subsídios praticados pelos países desenvolvidos, mas sim pela sua eficiência e produtividade adquirida com muito esforço ao longo dos anos. Prova disso é a safra recorde de grãos que este ano deverá ser de 160 milhões de toneladas.

O problema do abastecimento e segurança alimentar do planeta somente será resolvido em duas direções óbvias, a primeira seria com ganhos de produtividade, e a segunda, abrindo-se novas áreas de plantio. Segundo a Organização das Nações Unidas para a Agricultura e Alimentação (FAO), o mundo precisará aumentar em 70% a produção de alimentos até 2050 para atender a uma população que deve chegar a 9 bilhões. A contribuição brasileira em termos de novas áreas para agricultura pode vir dos 220 milhões de hectares hoje ocupados com pastagens (Luiz loureiro, valor: 28/06/11). Apesar do imenso rebanho bovino brasileiro, que dá ao Brasil o título de maior exportador da carne bovina do mundo, a aplicação de técnicas modernas de manejo e uso do solo, como as que o país já domina, pode muito bem disponibilizar grande parte daquela área, o que nos permite afirmar que o Brasil pode, no mínimo, dobrar a área plantada em poucos anos sem abater uma árvore sequer. Outro movimento é o de ganhos de produtividade associados á adoção de novas tecnologias desenvolvidas por centros de excelência em pesquisa agropecuária, como a EMBRAPA e diversas Universidades Brasileiras.

O esforço brasileiro de reformar o Código Florestal para equilibrar produção e proteção ambiental tem sido um exemplo para o mundo. Podemos estar criando um modelo de economia agrícola que seja capaz de convergir as necessidades crescentes de gêneros alimentícios para um sistema produtivo sustentável ambientalmente. As áreas de Reserva Legal em unidades particulares é uma criação brasileira. Para a região amazônica ela será de 80% da propriedade; para áreas do cerrado será de35%; e para o restante do país de 20%.

Observamos que o Brasil passa por um momento extraordinário em sua história, mas um momento de fortes decisões. Foi-se o tempo em que havia dois centros de comando e gestão da política e da economia do país, onde um localizava-se em Washington, através do FMI, e o outro, de soberania limitada, em Brasília. Hoje conquistamos o direito inalienável de decidir sobre o nosso próprio futuro e não serão as pressões de grandes potências que influenciarão as decisões do nosso modo de viver, trabalhar e produzir. O Brasil não deve nada a ninguém em termos ambientais, pelo menos não mais que a imensa maioria das nações ditas desenvolvidas ou emergentes. Todas elas estão atrás do Brasil no quesito proteção às florestas.

Dessa forma o problema ambiental no mundo diz respeito ao Brasil sim, mas não somente, e não será sacrificando o nosso desenvolvimento que haveremos de salvar o planeta da “catástrofe eminente”, enquanto a Europa “civilizada” e a potência estadunidense se safam de suas responsabilidades - justamente eles os que mais poluem o globo - e também eles que financiam ONGs aqui no Brasil para tentar imprimir um Código Florestal draconiano e insustentável do ponto de vistas dos interesses nacionais.

Murilo Ferreira é professor de Economia Rural, diretor do Sinpro e da CTB Minas

Publicado no Portal http://www.vermelho.org.br/mg em 2 de Julho de 2011

http://www.vermelho.org.br/mg/noticia.php?id_noticia=157795&id_secao=76

sexta-feira, 24 de junho de 2011

Por que o Salário Mínimo Regional em Minas?

Murilo Ferreira da Silva*

Ao verificar o atraso mineiro, seis Centrais Sindicais do estado – CTB, NCST, CUT, CGTB, UGT e Força – realizam diversas ações para promover o debate e conscientização de que o salário mínimo regional pode ser um importante instrumento para democratizar a renda e promover um processo acelerado de crescimento do mercado interno e do desenvolvimento regional. O objetivo fundamental é instituir uma política que regulamente o valor do salário mínimo, de forma a associar sinergicamente os ganhos reais de salário aos ganhos da economia e a uma concepção de desenvolvimento regional. Tudo isso, elaborado e implementado com a efetiva participação da sociedade civil.

Minas Gerais possui o terceiro maior PIB do Brasil, com uma participação de 9,3% em relação ao total produzido pelo País, segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) de 2008. O estado perde somente para São Paulo, com 33,1%, e Rio de Janeiro, com 11,3%. Todos esses estados pertencem à região Sudeste, a mais rica do País e que concentrava, também naquele ano, 56% da renda nacional. Contudo, Minas é o único dos Estados mais ricos do Brasil que ainda não adotou o Salário Mínimo Regional. Os que adotam são: São Paulo, Rio de janeiro, Rio Grande do Sul, Paraná e Santa Catarina.

O que as diversas representações sindicais procuram, além de envolver o conjunto da sociedade nessa discussão, é superar o paradigma neoliberal em que o planejamento e a regulamentação foram desacreditados e postos de lado, em função da absolutização dos mecanismos de mercado. Assim, ao reorientar o rumo e fomentar alternativas, o movimento sindical tenta criar as condições para implantar um projeto de desenvolvimento para Minas. É necessário superar o atraso do estado na formulação de políticas públicas, valorizando o trabalho, o trabalhador e a distribuição de renda.

É sabido que as crises do capitalismo são provocadas pelo brutal processo de concentração e acumulação de riquezas. Desde a crise da economia global iniciada em 2007, o Brasil tem como um grande desafio contrariar a lógica imanente desse sistema. A economia mineira é, essencialmente, exportadora e concentrada na: mineração; poucas commodities agrícolas, dentre elas o café; e em poucos setores industriais, como o automotivo. Quase nada se faz para reverter um processo desproporcional de concentração e centralização de riquezas. Associado à essa característica, nota-se o fato de que o grande capital local tudo faz para manter subjugado o trabalhador e arrochado o seu salário. A pretensão é garantir melhores condições no mercado externo. Tal fato acelera as distorções e contradições do capitalismo mineiro, levando a um processo de desenvolvimento também distorcido e concentrador.

Mas o que ainda está em jogo é o processo de desenvolvimento de regiões menos prósperas e deprimidas economicamente. Sabe-se o quanto a valorização do salário mínimo tem contribuído para o desenvolvimento do País e do Nordeste em particular. Esse instrumento pode ser usado em Minas para minimizar as distorções regionais de participação na renda e sua efetiva distribuição.

A valorização do salário tem impacto direto nos mercados locais e camadas mais pobres da população. Sem dúvida, a medida reorientaria uma economia essencialmente exportadora e capaz apenas de gerar riquezas para poucos. A valorização do salário é alavanca fundamental na superação da pobreza, e incorpora ao mercado de trabalho e consumo uma parcela ainda grande da sociedade mineira, excluída do processo de geração e apropriação da riqueza gerada no Estado.

(*) Diretor da CTB Minas

Publicada em 22/06/2011 no Blog: www.ctbminas.blogspot.com

quinta-feira, 9 de junho de 2011

O “boom” agropecuário

Os problemas do abastecimento de etanol no mercado interno derivam, basicamente, da elevação do preço do açúcar no mercado internacional, onde maior parte da produção nas usinas está reorientada para este último, em detrimento do primeiro. Seria um vexame se nesse momento os EUA abolissem as barreiras de entrada ao etanol brasileiro, pois, dificilmente poderíamos suprir a demanda daquele país, já que não estamos conseguindo suprir a contento nem o mercado doméstico.

Além do açúcar, várias commodities agrícolas decolaram seus preços há pouco mais de um ano, causando um processo inflacionário a nível mundial, entre elas estão a soja, o milho, as carnes e o café, todas com forte impacto em nosso país, proporcionando o aumento dos investimentos no campo e na produção. Como diz Cristiano Romero: isso se deve ao ”acelerado processo de urbanização de potências emergentes como China e Índia, que juntas tem mais de 2 milhões de habitantes” (Valor: 08/06/11).

A crise econômica por que passam os EUA, a Zona do EURO e o Japão parece não afetar o ritmo acelerado da expansão agropecuária brasileira. Tais potências tradicionalmente protegem suas agriculturas da competição de países como o Brasil a partir de fortes subsídios, o que moveu nossa política externa com relação ao comércio internacional a vários contenciosos e impasses em negociações na OMC. É possível, no entanto, que se fossem revogados esses procedimentos não teríamos também a capacidade de suprir, pelo menos por algum tempo, uma suposta elevação da demanda por nossos produtos. Resultado, essa política de subsídios torna-se um problema para países com elevado grau de endividamento, como EUA, França e Itália, pois o aquecimento dos preços das commodities agrícolas passa a não mais justificar o uso de instrumentos protecionistas.

Contudo, a perspectiva de crescimento da safra brasileira nos próximos anos é excelente e não é difícil imaginar que podemos chegar a produzir 200 milhões de toneladas de grãos por volta de 2016. Já na atual safra, produziremos cerca de 160 milhões de toneladas, ou seja, em pouco mais de dez anos acrescentamos 100 milhões a mais em nossa safra agrícola, um desempenho extraordinário. Mas haveria o risco de superprodução? O que queremos demonstrar é que esse risco é baixo, na medida em que o crescimento no mundo se dá a partir dos países emergentes e sob uma lógica socialmente inclusiva de camadas da população mais pobre ao mercado de trabalho e consumo.

Nos últimos 50 anos abriu-se um verdadeiro “eldorado” agrícola no centro-oeste brasileiro, o que lhe conferiu muita prosperidade e um notável desenvolvimento econômico. A excelência agrícola fica por conta de Mato Grosso, que assume a liderança nacional na produção de grãos. Contudo, um novo modelo agrícola está em gestação e ele em muito irá depender das regras fixadas pelo Novo Código Florestal, isto é, se ele irá constituir-se em um mecanismo efetivo de proteção às florestas e em consonância com o desenvolvimento agropecuário ou se ele, pela sua radicalidade, deverá ser um instrumento para obstruir esse desenvolvimento e penalizar a agricultura nacional, como tanto sonha a Europa e os EUA. A soberania e independência do país, portanto, está colocada à prova mais uma vez.

Caso prevaleça o bom senso e o devido equilíbrio entre a defesa do meio ambiente e o desenvolvimento agropecuário, têm-se razões para se afirmar que o país poderá dobrar sua área plantada sem que haja desmatamento e, respeitando-se devidamente as regras do Novo Código Florestal que vier a ser estabelecido. É óbvio que a maior de todas as preocupações é com a região amazônica. E a meu ver, nesta região, toda unidade de produção agrícola teria que ter Reserva Legal de pelo menos 80%, como está previsto, isso não considerando as tais unidade familiares de até 4 módulos fiscais, que seria outra discussão. Mas, tratando-se apenas dos grandes empreendimentos, também é óbvio que mesmo se restringindo a exploração agropecuária a apenas 20%, em termos amazônicos, isso ainda poderia expandir em muito a nossa fronteira agrícola.

A década de 2010 poderá ser a década da Amazônia em termos de desenvolvimento econômico, mas também ambientalmente sustentado. E assim essa região ser exemplo de um modelo que seja capaz de gerar prosperidade e ao mesmo tempo reserve e proteja as florestas e o meio ambiente. O nível de excelência em tecnologia agrícola alcançado pelo Brasil através da EMBRAPA e das Universidades públicas tem sido determinante nesse processo, pois além da produção tecnologicamente ajustada aos diversos ambientes amazônicos, o seu já elevado nível aponta que se terá cada vez maior produção sobre menos área, conferindo ainda mais proteção ambiental, produtividade e eficiência ao sistema agropecuário.

Acrescente-se a esses ganhos de produtividade a redução dos custos provenientes de um investimento pesado em infraestrutura na região. Serão construídos novos portos, ferrovias, hidrovias e rodovias, além dos mega investimentos em produção de energia, como as usinas de Santo Antônio e Jirau em Rondônia, que até 2013 deverá acrescentar 24.066 megawatts ao sistema energético, e as usinas de Belo Monte e Tapajós, que deverão acrescentar outros 32406 megawatts de 2014 a 2019 (Valor: 08/06/11). Finalmente os povos da Amazônia podem ter uma alternativa econômica efetiva, ao invés do modelo “santuarista” que reservaria a região ao atraso econômico e ao isolamento. Ao invés disso cresce a perspectiva de se alcançar um modelo de desenvolvimento sustentável e a plena e efetiva integração da Região Amazônica ao projeto de tornar o Brasil uma nação próspera, moderna, soberana e que elimine as grandes disparidades regionais.

Murilo Ferreira da Silva
Diretor do SINPRO MINAS e da CTB MINAS

Artigo publicado no dia 9 de Junho de 2011, no Portal http://www.vermelho.org.br/mg/
ou http://www.vermelho.org.br/mg/noticia.php?id_noticia=156086&id_secao=76

sexta-feira, 25 de março de 2011

A esperança venceu o pessimismo das viúvas de FHC

Em artigo publicado no Jornal Valor Econômico, no dia 24/03/11, Gustavo Loyola, o economista da era FHC, derrama um pessimismo assustador sobre o País. Ele cita a pesquisa de opinião do Instituto Datafolha, segundo o qual elevou-se o pessimismo da população brasileira quanto à capacidade do governo de conter a inflação.


Para Loyola, pessimista da era FHC aumentar o juros é a solução
Tal inclinação viria dos graves e continuados atentados que a tríade sustentadora da estabilidade estaria sofrendo: políticas fiscal, cambial e monetária. Loyola argumenta que houve forte queda dos superávits primários e redução da transparência na contabilidade fiscal, além do expressivo aumento dos repasses do tesouro a entidades públicas, notadamente Petrobras e Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).

Já o câmbio, estaria menos flutuante, devido às medidas administrativas do governo e às intervenções do Banco Central. A política monetária, por sua vez, seria o “último bastião da estabilidade”. Mesmo aí, a coordenação das expectativas para Loyola tornou-se mais complicada, já que os agentes de mercado passaram a perceber mais disposição do governo para correr riscos inflacionários.

Gustavo Loyola considera como exótica a tese do governo de que o melhor ataque à inflação vem do aumento da oferta. O economista da era FHC ainda critica o Ministro da Fazenda, Guido Mantega, pois este avalia que o BNDES não pressiona a inflação. Segundo o ministro, o investimento permitiria maior oferta de produtos na economia.

Para Loyola, é equivocado achar que as medidas macroprudenciais são mais eficazes do que elevar os juros para conter a inflação. Ele diz que tais medidas refletem a “torcida” para que o Banco Central contenha o aumento da taxa Selic. Por fim, o economista defende que somente a elevação da taxa de juros poderia restringir a demanda agregada, garantindo a estabilidade da moeda.

Contrário ao pessimista Loyola, não considero que houve “atentados” à tríade que sustenta a estabilidade. O economista, na verdade, está criticando os métodos adotados pelo governo Lula em 2009, para que o País saísse da crise. Lula foi bem sucedido nas medidas anticíclicas como reduções de impostos e juros, além da ampliar o consumo. Não nos esqueçamos dos aportes ao BNDES e os incrementos no PAC, cujo carro-chefe foi a Petrobras. O resultado foi o crescimento de 7,5% em 2010. Os números falam por si, e não há porque termos pessimismos, a não ser para os tucanos que perderam a eleição.

São muitas as controvérsias em relação ao câmbio. A opinião de Loyola não é compartilhada por grandes especialistas. O que existe é uma verdadeira guerra cambial no planeta. As medidas dos EUA inundam os mercados de dólares e pressionam pela valorização excessiva do real. Diante disso, são mais do que corretas as medidas do governo e do Banco Central para reverter tal tendência.

É óbvio que o governo não está disposto a correr riscos inflacionários. O problema central é não abrir mão do crescimento. O País já deixou a Itália para trás, e prepara-se para ultrapassar a Alemanha no ranking das grandes economias. São outras as perspectivas alimentadas no momento. O olhar míope (e comprometido?) de Loyola só consegue enxergar a taxa de juros como o único instrumento de combate à inflação. Suas idéias fatalmente implicariam na derrocada do atual crescimento brasileiro.


*Murilo Ferreira da Silva é diretor da CTB Minas e do Sinpro, Sindicato dos Professores.

Artigo publicado no Portal http://vermelho.org.br/mg em 24/03/11

http://vermelho.org.br/mg/noticia.php?id_noticia=150305&id_secao=76

e no Portal da CTB: http://portalctb.org.br em 24/03/11 sob o Título: "As medidas macrofinanciais de Gustavo Loyola"
http://portalctb.org.br/site/opiniao/as-medidas-macrofinanciais-de-gustavo-loyola

quinta-feira, 17 de março de 2011

Murilo Ferreira : Querem derrubar Dilma pela econômia

Em entrevista à jornalista Cláudia Safatle, do Jornal Valor Econômico, no dia 17/03/2011, a presidenta Dilma foi enfática na defesa do crescimento brasileiro sem, no entanto, permitir a volta da inflação.

Questionada pela jornalista, segundo a qual há quem argumente, na ponta do lápis, que não é possível reduzir a inflação de 6% para 4,5% e crescer 4,5% a 5%, ela diz: “Você pode fazer várias contas. É só fazer um modelo matemático. Agora, se ela é real...”

Nas condições atuais da economia ela admite alguns desequilíbrios em alguns setores, mas não considera que a inflação brasileira seja inflação de demanda e que a pressão exercida por uma demanda aquecida pode ser diminuída aumentando-se, em contrapartida, a oferta de bens e serviços através do aumento dos investimentos. Para ela o que mais vem influenciando o comportamento dos índices acima da meta são os desequilíbrios sazonais: “...é inequívoco que houve nos últimos tempos o crescimento dos preços dos alimentos, que já reduziu. Teve aumento dos preços do material escolar, dos transportes urbanos”.

Dilma considera ainda falsa a idéia que o país não tem estrutura suficiente para suportar um alto crescimento, ”... não é possível falar que o Brasil está crescendo além de sua capacidade e que, portanto, tem crescimento pressionando a inflação. O mundo inteiro, na área dos emergentes, está passando por isso. Houve um processo de pressão inflacionária que tem um componente ligado às commodities e, no Brasil, tem o fator inercial. Mas é compatível segurar a inflação e ter uma taxa de crescimento sustentável para o país. Caso contrário, é aquela velha tese: tem que derrubar a economia brasileira”.

Dilma aposta no crescimento Brasileiro entre 4,5 e 5% em 2011, contradizendo as previsões do mercado de que a economia irá crescer entre 3,5 e 4 %. Desconstrói a idéia de PIB potencial em torno de 3,5%, pois o país cresceu 7,5% em 2010 puxado pelo aumento em bens de capital. Para ela não tem inconsistência em cortar R$ 50 bilhões do Orçamento e repassar R$ 55 bilhões ao BNDES para garantir os financiamentos do programa de sustentação do investimento: “...não precisamos expandir o investimento para além do maior investimento que tivemos, que foi o do ano passado. Vamos mantê-lo alto. Olhe quanto investimos em janeiro: R$ 2,5 bilhões pagos”.

Sobre se o governo não está fazendo uma política contracionista, mas sim menos expansionista do que foi no ano passado, Dilma diz que o que está ocorrendo é uma política de consolidação fiscal, ressaltando sua preocupação com o crescimento desordenado dos gastos com custeio.

A jornalista do Valor questiona ainda a presidenta sobre a preocupação de analistas que para 2012 ocorreria uma superindexação do salário mínimo num momento em que o país estará em plena luta antiinflacionária. Sobre isso Dilma afirma que o processo de valorização do salário mínimo ainda não se esgotou e que pela proposta votada de correção pela inflação e pelo PIB até 2015 não se fará qualquer negócio: “...quando a economia vai mal, nós não vamos dar reajuste, ele será zero. Vamos dar a inflação. Quando a economia vai bem, com um atraso de um ano, nós damos o que a economia ganhou ali, porque acreditamos que houve um ganho global de produtividade e de crescimento sistêmico. O prazo de um ano amortece, mas transfere ao trabalhador um ganho que é dele, é da economia como um todo...” E fulmina: “... Não acho que isso seja uma indexação e quem falar em indexação tem imensa má vontade com o trabalhador brasileiro”.

Esse conjunto de idéias sobre inflação e crescimento contrasta visivelmente com os analistas de mercado que desde início de seu governo vêm fazendo grande barulho sobre as expectativas de alta da inflação e da necessidade de o governo elevar ainda mais a taxa de juros e diminuir gastos e investimentos para frear a economia, pois estaria ela, segundo eles, muito aquecida.

Para Dilma, que e não comunga com a idéia de que é possível ter um pouco mais de inflação para obter um pouco mais de crescimento, não há possibilidades de tergiversações com a inflação e que no seu governo o combate a ela será implacável, contudo, isso não se dará à custa do investimento, do crescimento, das políticas de distribuição de renda, da valorização do salário, dos programas do governo e do desenvolvimento do Brasil.


Publicado no dia 17/03/11 no portal http://www.vermelho.org.br/mg

http://www.vermelho.org.br/mg/noticia.php?id_noticia=149748&id_secao=76